quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Em Conferência Advogado Defende Direito das Testemunhas de Jeová





O advogado Eduardo Mendonça defendeu em conferência realizada nesta sexta-feira (3), durante o I Congresso Brasileiro de Direito Médico do CFM, o direito de pacientes adultos e capazes à recusa de procedimentos médicos. Na avaliação do advogado, a recusa a transfusões de sangue por parte de testemunhas de Jeová é aceitável no ordenamento jurídico brasileiro. “Não cabe ao Estado avalizar decisões existenciais que ele valoriza e repudiar as que ele talvez não valorize. Em um Estado democrático, deve haver respeito verdadeiro pelas opiniões das pessoas”, disse. “A testemunha de Jeová entende que esta ou aquela decisão é essencial para o seu modo de vida; sem tal decisão haverá um esvaziamento de sua dignidade”, completou Mendonça
Entre as decisões que o Estado aparentemente valoriza está, segundo o advogado, a de uma mulher que opta por dar continuidade a uma gravidez de risco. “O Direito não força uma mulher que esteja nessas circunstâncias a adotar a postura mais segura. É uma decisão existencial tomada com base em valores. A autonomia de vontade também é preservada quando alguém se oferece como voluntário para trabalhar em zonas de guerra, por exemplo”, afirmou o advogado.
Eduardo Mendonça acredita que decisões que colocam a saúde e a vida em risco devem ser tomadas de modo livre, informado e personalíssimo – sem representação – por pessoas que tenham plena capacidade cognitiva. “Excluo a possibilidade de que, nesses casos, pais tomem decisão por seus filhos menores, e também não avalio como juridicamente possível que um menor tome qualquer decisão que coloque em risco sua vida”, analisou Mendonça, cuja conferência teve o título A constitucionalidade ou inconstitucionalidade dos tratamentos compulsórios.

Especialista fala sobre autonomia e tratamantos compulsórios

O advogado Eduardo Mendonça proferirá no I Congresso Brasileiro de Direito Médico do Conselho Federal de Medicina (CFM) a conferência A constitucionalidade ou inconstitucionalidade dos tratamentos compulsórios. O Congresso começa nesta quinta-feira (2), em Brasília. Nesta entrevista Mendonça fala sobre a autonomia do paciente do ponto de vista jurídico.

Os tratamentos compulsórios são constitucionais ou não?
Há situações em que se pode impor o tratamento por conta de valores que são protegidos pela ordem jurídica e há situações em que se deve respeitar a vontade do paciente por conta de valores que são protegidos pela constituição. Sou favorável a não se impor tratamento a um maior, a um paciente maior de idade plenamente consciente e capaz que recuse tratamento por razões de ordem existencial, mas sou favorável a que se imponha tratamento a um menor numa situação semelhante. Portanto, acho que a resposta varia de acordo com caso e circunstâncias.

Os dependentes químicos podem ser submetidos compulsoriamente a tratamento?
Acho que sim, na medida em que o uso da substância impeça a decisão consciente. É lógico que é uma avaliação muito delicada, caso a caso, mas certamente há substâncias que entorpecem e causam alucinações ou coisas do gênero que impedem a decisão livre. Acho que o importante para a ordem jurídica é que a decisão seja consciente, informada e livre, portanto sem pressões externas. Há uma corrente do Direito que não admite nenhum tipo de recusa a tratamento, mesmo quando há uma decisão consciente e livre, mas, para quem admite a recusa como possível, um elemento essencial é a decisão informada, consciente e livre.

Ainda é possível que haja algum questionamento sobre a legalidade da recusa a tratamento médico?
Esse é um espaço ainda a ser pacificado, sem nenhuma dúvida. Quando existe a decisão do paciente e ela é respeitada, a questão não costuma chegar ao Judiciário. Se essas questões chegassem ao Judiciário haveria decisões conflitantes, algumas reconhecendo o direto do paciente e outras recusando ao paciente esse direito. Há uma corrente de opinião, com muitos adeptos eu diria, que entende como impossível, ilegal, a recusa de tratamento – entende que o médico estaria cometendo um ato ilícito ao atender a esse pedido. Há uma tentativa até de criminalizar essa conduta, como omissão de socorro ou negligência. Entendo pessoalmente que não é apropriado usar essas figuras para essa hipótese, mas, sem nenhuma dúvida, em tese é possível essa responsabilização. Entendo que isso é incorreto, que não é adequado do ponto de vista jurídico. De modo geral há uma convergência entre a vontade do paciente e a conduta do médico. Mas pensando do ponto de vista teórico, seria possível discutir a questão, sem dúvida.

A vontade da família, quando divergente da do paciente, pode complicar o respeito à vontade do paciente?
Eu veria nessa situação dois aspectos: um aspecto prático e um aspecto teórico. Do ponto de vista prático, esse complicador, a divergência da vontade do paciente e da família pode levar a questão a ser judicializada. Pode levar a questão ao Judiciário e provocar uma decisão que pode ser desfavorável; então, do ponto de vista prático é normal que o médico fique intimidado com uma situação assim. A questão teórica, que é saber se a vontade do paciente deve ser respeitada ainda quando gere risco de vida e ainda quando contrarie a vontade do familiar, eu pessoalmente entendo que sim, desde que essa vontade tenha sido manifesta de forma informada, ele tenha tido acesso a informação relevante do caso, que ele tenha tido condições de compreender a informação, que ele tenha tido condições plenas de consciência para tomar essa decisão e que não tenha sofrido pressões indevidas. Esse ponto é muito importante porque em algumas situações a participação da pessoa num determinado grupo religioso, por exemplo, pode levar a pressões externas, tem que ser ponderadas em cada caso.

A formalização da vontade do paciente em algum tipo de documento é necessária?
A formalização ou registro de alguma forma que seja confiável é uma garantia do médico, uma vez que você não havendo formalização pode haver uma discussão sobre prova se o caso for levado ao Judiciário. Então imagine uma situação em que o paciente tenha externado a vontade de não se submeter ao tratamento, a família seja contra a vontade do paciente e o médico contrarie a família em respeito ao paciente. Uma vez que esta questão seja levada ao judiciário é possível que o médico tenha dificuldade de prova. Ele vai ter que demonstrar de alguma forma que respeitou a vontade do paciente em primeiro lugar. Tirando esse aspecto prático, entendo que não há impedimento no direito brasileiro que se faça o testamento vital. Ele pode não estar regulado especificamente em um ato normativo, mas é uma forma de se garantir ao paciente que a vontade dele será respeitada – e garantia também para o próprio médico. Então, na medida em que seja possível, acho que os médicos que se depararem com essa situação devem providenciar o registro da vontade do paciente.

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